terça-feira, 26 de abril de 2011

Anarquismo: Arvore Genealógica (Woodcock, George)


Anarquismo


 Woodcock, George Historia das Idéias e Movimentos Anarquistas – v.1: A idéia: tradução de Júlia Tettamanzy. Porto Alegre:L&PM, 2007. 272 p.




Arvore Genealógica

O Anarquismo deve ser pensado de maneira paradoxal, como manifestação dos anseios naturais do ser humano.
Destacam-se dentro dos historiadores anarquistas nomes como kropotkin, Max Nettlau e Rudolf Rocker.
“O anarquismo – declarou Kropotkin – surgiu entre o povo e só conseguira preservar sua vitalidade e sua força criativa enquanto continuar sendo um movimento popular”.
Em seu livro “A Ciência Moderna e o Anarquismo” de Kropotkin nos fornece a seguinte idéia: “Há duas correntes de pensamentos e ação em conflito na sociedade”.
“Elas são de um lado, as tendências á “ajuda mutua” exemplificada pelos costumes tribais, pelas comunidades aldeãs pelas guildas medievais e, na verdade, por todas as instituições criadas e mantidas pelo espírito criativo das massas”; e, por outro lado, a corrente autoritária, que começa com os curandeiros, magos, bruxos, feiticeiros, oráculos e sacerdotes, ate chegar aos oficiais de registro e aos “chefes de bandas militares”.
Desconsidera a visão de que os camponeses da Inglaterra do séc.XIV e na Alemanha do séc.XVI eram revolucionários, suas exigências não passavam de reformistas.
A primeira apresentação literária de uma sociedade igualitária ideal, a Utopia, de Thomas Moro (1516), é governada por uma autoridade eleita por um sistema bastante complexo e impõe regra de comportamento individual extraordinariamente severa.
Engels resumiu essa situação de forma bastante clara na sua “As Guerras Camponesas na Alemanha”: “Proclamou-se a posse comum de todos os bens, as mesmas e universais obrigações de trabalho e a abolição de todas as formas de obrigação de trabalho e a abolição de todas as formas de autoridade. Mas na verdade, Mulhaüsen continuou sendo uma cidade imperial republicana com um senado eleito por sufrágio universal e sob o controle de um foro e um sistema improvisado para alimentar os pobres. As transformações sociais que tanto horrorizaram os protestantes da classe média da época jamais foram alem de uma tênue e inconsciente tentativa para estabelecer prematuramente a sociedade burguesa de um período anterior”.
O que o autor chama atenção é que carece a esses movimentos do ponto de vista anarquista, era o elemento de individualismo que teria contrabalançado seu igualitarismo. Aqui os historiadores anarquistas cometem um erro de pensar que a comunidade popular primitiva ou medieval baseadas na ajuda mútua é toscamente igualitária por natureza são também individualista.
Na Europa pós-medieval a tendência individualista surgiu entre as classes cultas das cidades italianas do Quattrocento: ela aparece sob a forma de um culto á personalidade sem qualquer relação com reforma social e resulta tanto no orgulho do ditador quanto no desejo do sábio humanista, por múltiplas satisfações, criando um novo interesse pelo homem como individuo e não como simples membro da ordem social.
Outro ponto que é dado ênfase e que no séc.XVII não eram os niveladores, mas um grupo efêmero, cuja forma de protesto social valeu-lhe o nome de “cavadores”.
Os cavadores, por outro lado, eram em sua maioria homens pobres, vítimas da recessão econômicas que se seguiu a Guerra Civil, e suas reivindicações tinham um cunho social e econômico. Acreditavam terem sido roubados por aqueles que continuavam ricos, não apenas de seus direitos políticos, mas ate mesmo do direito elementar aos meios de sobrevivência.
Esses cavadores criaram sua teoria em 1648 e passaram á ação em 1649. No primeiro panfleto de Winstaley “A verdade erguendo-se por sobre as nuvens”, estabeleceu-se a base filosófica do movimento, dando-lhe um cunho racionalista. Na visão de Winstaley, Deus não era outro senão “aquele espírito inteligível a razão”. “E onde habita a razão”? – pergunta ele. Ela esta em todas as criaturas, de acordo com sua natureza e essência, mas especialmente no homem. Por esse motivo, o homem é chamado de ser racional... “Este – numa interessante antecipação de Tolstoi – é o Reinado de Deus no Homem”.
“Permita que a razão governe o homem e ele não se atreverá transgredir contra seus semelhantes, mas fará a eles o que quer que lhe tenham feito. Pois a razão lhe diz que, se o vizinho está faminto e nu, é preciso alimentá-lo e vesti-lo, pois talvez isso aconteça contigo amanhã e então ele estará pronto a ajudar-te”.
Igualando Cristo á “liberdade universal”, ele começa com uma exposição sobre a natureza corruptora da autoridade – e aqui faz uma critica não apenas ao poder político, mas ao poder econômico do patrão sobre o empregado, do poder familiar do pai sobre o filho e do marido sobre a esposa.
“Todo aquele que tem autoridade nas mãos procede como um tirano; quantos maridos, pais, patrões, juizes portam-se como senhores, oprimindo que estão sob seu poder, sem saber que essas esposas, filhos, servos e súditos são seus semelhantes e tem os mesmos direitos a repartir as bênçãos da liberdade”.
Se a critica que Winstanley faz da sociedade, tal como a vê nesse momento crucial de sua carreira, acaba numa rejeição tipicamente libertaria, tanto da autoridade como da propaganda, sua visão do tipo de sociedade igualitária que gostaria de criar incorpora muitas características de uma sociedade ideal, tal como seria imaginada pelos anarquistas dois séculos mais tarde.
Winstaley antecipou toda a serie de filósofos libertários, ao condenar o castigo, afirmando que o crime é uma conseqüência da desigualdade social.
“Certamente é a propriedade individual e privada a responsável pela miséria do povo. Pois, primeiro ela faz com que com que as pessoas roubem uma das outras e, depois, cria leis para enforcar aqueles que roubam. Ela induz à pratica do mal e depois mata quem a praticou. Que todos julguem se esse não é realmente um grande mal!”.
Na verdade, não foi tão completamente esquecido que mesmo William Godwin, ao escrever a Historia do Commonwealth, não parece ter percebido o quanto a doutrina dos cavadores se parecia com aquela que ele próprio havia criado na sua Justiça política.
O comunismo de Winstaley é inteiramente libertário e o esforço dele e seus amigos para por em pratica esses princípios durante a experiência de St. George Hill coloca-o entre os precursores da tradição anarquista.
Paine – tal como Godwin – fala de governo como de um obstáculo “à inclinação natural pela vida em sociedade” e afirma: “Quanto mais perfeita a civilização, menos necessidade terá de um governo, porque mais capacidade terá para resolver seus próprios problemas e auto governar-se”.
Paine se aproximava bastante dos anarquistas em temperamento e idéias e só a sua falta de otimismo no futuro imediato o impediu de se tornar um deles.
Na revolução Francesa, por outro lado, o choque entre as duas tendências – libertaria e autoritária – era evidente e em certas ocasiões chegava a assumir formas violentas.
Condorcet, um dos cérebros mais fecundos da época, que acreditava no progresso infinito do homem rumo a uma liberdade de classes, já havia anunciado – enquanto se escondia dos jacobinos – a idéia de mutualité, que viria a ser um dos pilares do anarquismo de Proudhon. Condorcet concebeu o plano de criação de uma grande associação de “ajuda mutua”, que reuniria todos os operários para salva-los do perigo das crises econômicas, durante as quais eram normalmente obrigados a vender seu trabalho em troca de salários de fome.
O outro pilar do anarquismo Proudhoniano era o federalismo, objeto de muitas discussões e experiências durante a revolução. Mas é preciso buscar alem do mutualismo de Condorcet e do federalismo da Comuna para encontrar os verdadeiros proto-anarquistas da Revolução Francesa.
O movimento dos Enrages surgiu em 1793, correu com um baixo obstinado e rabugento durante os anos de terror. Tais como os cavadores da Guerra Civil inglesa, eles surgiram num período de recessão econômica, em grande parte como resposta ás dificuldades econômicas por que passavam os pobres de Lyon e Paris, mas também como uma forma de reagir ás distinções de classe que marcaram o crescente poder da classe media em ascensão.
Os Enragés não formavam um partido político, no sentido moderno do termo. Não tinham qualquer tipo de organização definida, nem uma orientação política única. Constituíam um grupo desagregado de revolucionários que tinham idéias semelhantes, cooperavam uns com os outros de forma rudimentar e que, no entanto, mantinham sua união por não aceitar as idéias dos jacobinos sobre a autoridade do Estado, defendendo a idéia de que o povo deve exercer ação direta e vendo nas medidas econômicas comunistas, mais do que na ação política, o caminho para acabar com o sofrimento dos pobres.
Jacques Roux, o mais célebre dos Enragés, era um dos sacerdotes da revolução, um padre da zona rural que, mesmo antes de chegar a Paris em 1790, já havia sido acusado de incitar os camponeses do seu distrito a queimar e pilhar os castelos dos proprietários que tentavam fazer valer seus direitos aos tributos senhoriais. “A terra pertence a todos”, teria dito aos seus paroquianos.
Desde o inicio Roux desempenhou papel ativo na vida revolucionaria de Paris. Freqüentava o Club des Cordelliers e em março de 1792 ocultou Marat em sua própria casa, fato que não o livraria mais tarde dos ataques de alguns auto proclamados “amigos do povo”. Concorreu sem sucesso como cadidato á Convenção e eventualmente tornou-se membro do Conselho Geral da Comuna.
Nele, deixava entrever pela primeira vez suas tendências anarquistas ao declarar: “A ditadura dos senadores é tão terrível quanto o cetro dos reis, pois acorrenta as pessoas sem que elas o percebam, brutalizando-as e subjugando-as através de leis que elas julgam ter criado”.
Durante o ano de 1793, o jovem orador revolucionário Jean Varlet uniu-se a Roux.
Jacques roux fez uma serie de discursos nos quais não apenas denunciava a estrutura de classes que a Revolução tinha mantido – “Que liberdade é essa em que uma classe de homens mata a outra de fome?” -, mas também sugeria que a lei protege a exploração, que prospera “à sua sombra”. E, como não confiava nos legisladores, exigiu que a condenação aos lucros excessivos fosse inserida na constituição, de tal maneira que ficasse protegida da ingerência dos governos.
Roux burlou a guilhotina suicidando-se de forma dolorosa. “Não me queixo do tribunal” – disse, antes de morrer. – Ele agiu de acordo com a lei. ”Mas eu agi de acordo com a minha liberdade. Morrer colocando a liberdade acima da lei é morrer como um anarquista.”
Depois que Robespierre caiu e que os Enragés se rejubilaram com a sua morte, Varlet testemunhou e tirania do Diretório que se seguiu e, na sua fúria, publicou o que devemos considerar como o primeiro manifesto anarquista da Europa Ocidental. Muito a propósito, chamava-se L`Explosion; a pagina de rosto trazia uma gravura mostrando uma nuvem de fumaça e labaredas de fogo que saiam de uma construção de estilo clássico e, sobre a gravura, lia-se a legenda: “Que acabem os governos revolucionários mas permaneçam os princípios”.
Analisando os anos da Revolução, disse Varlet:
“Que monstruosidade social! Que obra prima de maquiavelismo é na verdade esse governo. Para qualquer ser racional, Governo e Revolução são incompatíveis, a menos que o povo deseje criar órgãos que se coloquem permanentemente contra ele, o que seria por demais absurdo”.
No mesmo ano em que Varlet publicava sua L`Explosion, William Godwin editava na Inglaterra o primeiro grande tratado sobre os erros do governo, a Justiça política, e é realmente duvidoso que este pudesse ter sido concebida se a Revolução Francesa não tivesse acontecido naquele momento.



    






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